Segurança energética da Europa e cooperação UE-EUA

6/2/2022 — blogue do AR/VP — A energia sempre foi uma das questões geopolíticas mais importantes. Perante os elevados preços e as dificuldades em matéria de aprovisionamento de gás decorrentes da crise com a Rússia, esta questão ocupa um lugar de destaque na nossa agenda. Temos de fazer face às pressões a curto prazo, mantendo simultaneamente o nosso objetivo a longo prazo de uma transição para zero emissões líquidas. O Conselho da Energia UE-EUA, que terá lugar em Washington DC, reforçará a cooperação transatlântica neste domínio.

«Perante os elevados preços da energia e dificuldades em matéria de aprovisionamento de gás, temos de fazer face às pressões a curto prazo, mantendo simultaneamente o nosso objetivo a longo prazo de uma transição para zero emissões líquidas. O Conselho da Energia UE-EUA, que terá lugar em Washington DC, reforçará a cooperação transatlântica neste domínio.»

 

A caminho de Washington com o meu colega Kadri Simson, Comissário responsável pela Energia, o contexto mundial afigura-se preocupante em vésperas do Conselho da Energia UE-EUA, que copresidirei juntamente com o Secretário de Estado, Anthony Blinken, na próxima segunda-feira.

Os preços da energia propulsaram a inflação

Os preços da energia dispararam devido a problemas da oferta e da procura a nível mundial. Os preços do gás na UE são seis a dez vezes mais elevados do que há um ano, exercendo fortes pressões sobre os preços da eletricidade, devido à forma como estes preços são determinados no mercado grossista da eletricidade na Europa. Isto já tinha impulsionado a inflação no final de 2021. Se os preços da energia se mantiverem elevados ao longo de 2022, alimentando o aumento da inflação, tal afetará gravemente a recuperação pós-pandemia.

Infographic about EU imports of natural gas

Fonte: Eurostat

Com a grave crise que atravessamos atualmente com a Rússia, não se trata apenas de uma questão de preços, mas também uma questão de segurança do aprovisionamento. A política energética continua a ocupar um papel importante nas relações entre a UE e a Rússia: mais de 40 % das importações de gás da UE provêm da Rússia e 60 % das receitas da Rússia associadas à energia provêm da UE. Como disse na semana passada, ao reduzir a parte das importações globais de gás proveniente da Rússia, estaremos não só a investir na transição ecológica, mas também a reduzir as nossas dependências estratégicas. No entanto, nos últimos anos, a Rússia reforçou a sua resiliência face às sanções económicas, aumentando as suas reservas em divisas, mais do que nós reforçámos a nossa capacidade de enfrentar potenciais cortes no aprovisionamento de gás. Devemos ponderar urgentemente a constituição de reservas estratégicas de gás da UE e a possibilidade de aquisição conjunta de gás, tal como sugerido pela Comissão. Deste modo, estaríamos a reforçar a segurança coletiva a um preço gerível, tal como referido num relatório recente do grupo de reflexão CEPS.

A Rússia já anteriormente utilizou o aprovisionamento energético para fins políticos. Nas últimas semanas, embora a Rússia tenha cumprido rigorosamente os seus compromissos contratuais, a Gazprom, detida pelo Estado russo, recusou-se a enviar fornecimentos adicionais para reabastecer as instalações de armazenamento europeias, aumentando ainda mais o nervosismo no mercado.

Line graphic about the difference in the filling rates of Gazprom controlled storages and other storages

Fonte: Comissão Europeia

Assim, o que podem a UE e os EUA fazer para enfrentar os desafios a curto prazo e, simultaneamente, responder ao imperativo de alcançar zero emissões líquidas e reduzir a nossa dependência dos combustíveis fósseis? Juntamente com os EUA e outros parceiros, opomo-nos à utilização do aprovisionamento energético como arma e instrumento de pressão geopolítico. A recente declaração conjunta UE-EUA sobre a segurança energética já coloca a resiliência face a futuras perturbações dos preços e as salvaguardas contra as tensões geopolíticas no centro da agenda transatlântica de segurança energética. Estamos empenhados em garantir a segurança energética da UE e dos nossos vizinhos, incluindo a Moldávia, a Ucrânia e os Balcãs Ocidentais.

 

«Juntamente com os EUA e outros parceiros, opomo-nos à utilização do aprovisionamento energético como arma e instrumento de pressão geopolítico. Estamos empenhados em garantir a segurança energética da UE e dos nossos vizinhos, incluindo a Moldávia, a Ucrânia e os Balcãs Ocidentais.»

 

O ponto de partida da nossa estratégia é o Pacto Ecológico Europeu e a transição energética que queremos acelerar tendo em conta a emergência climática. Sabemos que esta transição não se fará de forma simples e linear, mas não podemos permitir que os atuais acontecimentos nos façam desviar da nossa trajetória.

O problema imediato da segurança do aprovisionamento de gás

No entanto, a curto prazo, enfrentamos e temos de resolver o problema imediato de garantir a segurança do aprovisionamento de gás. Isto implica envidar esforços com vista a uma maior diversificação das rotas e fontes de importação. Os EUA são já o primeiro fornecedor de gás natural liquefeito (GNL) da Europa e estamos a intensificar a nossa cooperação para garantir a segurança do nosso aprovisionamento de gás ao longo dos próximos meses. Para além dos EUA, estamos também em conversações com a Noruega, o Catar, o Azerbaijão, a Argélia e outros países para alargar os fornecimentos de GNL. Teremos também de trabalhar rapidamente no sentido de uma melhor integração, no mercado europeu da energia, da Península Ibérica, que é efetivamente uma «ilha elétrica» na Europa, uma vez que as suas capacidades de receção de GNL são superiores às dos outros países europeus. Estes esforços são mais suscetíveis de êxito se investirmos nas relações com potenciais fornecedores de GNL, não como uma solução a curto prazo, mas no âmbito do nosso interesse em desenvolver relações mais estratégicas, trabalhando também em energias renováveis, como o hidrogénio e a energia solar.

Bar chart about LNG imports to the EU by supplier

Fonte: Comissão Europeia

Enquanto nos esforçamos por alcançar os objetivos da UE em matéria de energia e clima e reforçar a nossa resiliência, temos de fazer o mesmo no que respeita à Ucrânia. Em termos de segurança energética, a Ucrânia está doravante mais bem preparada para fazer face a um eventual conflito. No entanto, tal como no resto da Europa, a verdadeira segurança energética só pode ser alcançada mediante mais investimentos em energias renováveis internas e melhores ligações com o mercado da UE. A nossa reunião constituirá uma oportunidade para procurar uma coordenação ainda mais estreita no que respeita às reformas do mercado da energia necessárias na Ucrânia para reforçar o governo das sociedades e a transparência na perspetiva da sincronização da Ucrânia com a rede elétrica europeia, prevista para 2023. Esforçar-nos-emos também por aumentar os fluxos bidirecionais no âmbito das infraestruturas de transporte de gás existentes.

 

«No fim de contas, só um sistema energético descarbonizado permitirá dispor de uma energia fiável, acessível e segura. É também por esta razão que a eficiência energética, as energias renováveis e o hidrogénio ocupam um lugar de destaque na nossa agenda comum com os EUA.»

 

Tudo isto nos ensina que: no fim de contas, só um sistema energético descarbonizado, baseado, em grande medida, em energias renováveis, nos permitirá dispor de uma energia fiável, a preços acessíveis e segura. É por esta razão que estamos também a cooperar estreitamente com os EUA no domínio da tecnologia. A eficiência energética, as energias renováveis (como a energia eólica) e o hidrogénio ocupam um lugar de destaque na nossa agenda comum. No ano passado, foi criado um novo Grupo de Alto Nível UE-EUA para a Ação Climática, e alinhámos as nossas posições na perspetiva da COP 26 de Glasgow. Este Conselho da Energia dará o sinal de partida à Aliança Transatlântica de Tecnologia Verde no que se refere à inovação e à implantação rápida e em escala, a nível mundial, das principais tecnologias de energia limpa, como bombas de calor, tecnologias avançadas de medição e armazenamento de energia de longa duração, nomeadamente através do reforço dos nossos esforços comuns em matéria de códigos, normas, certificação e quadros regulamentares.

A transição energética alterará os equilíbrios geopolíticos

A transição energética continuará a alterar os equilíbrios geopolíticos, transferindo o poder dos que controlam os combustíveis fósseis para os que desenvolvem tecnologias de energia limpa. Tal exigirá que os países que atualmente dependem de forma significativa das exportações de combustíveis fósseis diversifiquem as suas economias e temos de estar preparados para os ajudar a dar este grande passo em frente. A transição energética justa e para a neutralidade climática é vital para salvar o nosso planeta, mas também trará benefícios em termos de política externa: um mundo que funcione com energia limpa será um mundo mais estável e melhor para todos, embora também crie novas dependências devido aos materiais de que necessita. Na primavera, será publicada uma nova estratégia da UE em matéria de energia internacional, a fim de definir mais pormenorizadamente a nossa resposta aos desafios mais vastos que se colocam nesta matéria.

Em cooperação com os EUA, a UE continuará a construir uma transição energética global que seja socialmente justa e tenha em conta os desafios geopolíticos. Amanhã, trabalharemos em conjunto nesta vasta agenda, enviando uma mensagem forte aos que nos procuram dividir.

 

 

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